David Laerte Vieira
Assim, é aplicando-se o Princípio da Precaução que se tem respaldo para o imediatismo
na adoção de medidas em relação a esse universo bastante desconhecido que ainda o são os
organismos geneticamente modificados. Rejeita-se, portanto, a tese do adiamento de decisões, ao
argumento da inexistência de comprovação científica de danos.
De modo diferente pensam os defensores da liberação dos OGMs, a exemplo de Raquel
Monteiro Cordeiro de Azeredo, ao censurar, com um toque de ironia, o sistema precautório
inglês:
O sistema regulador inglês pretende introduzir uma forma de identificação mais
eficiente, que permita rastrear 'do campo à mesa', dispondo-se a rotular mesmo os
alimentos que, derivados de plantas transgênicas, não contêm sequer traços de DNA ou
de proteínas, como óleos e açúcar. Essa decisão parece remontar aos tempos da invenção
de carros motorizados, quando, em alguns países, um cavaleiro montado, carregando
uma bandeira vermelha, ia à frente de cada veículo a vapor um princípio de precaução
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que soa sem sentido emnossos tempos.
No mesmo sentido, criticando abertamente o "princípio precautório", Helga Hoffmann,
ex-diretora de Meio Ambiente e Desenvolvimento da Cepal (Comissão Econômica para a
América Latina e o Caribe, da ONU), diz que a precaução tem de ser proporcional ao risco,
cientificamente avaliado, de tal maneira que se o que está num dos pratos da balança for mais
preconceito do que risco, é socialmente injusto defender políticas públicas que apenas atendam
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de imediato a umdesconforto neoludita, travando a longo prazo o avanço de uma tecnologia
Outrossim, Adriana Vieira assevera que algumas manifestações sociais, apegando-se
ao mito da certeza absoluta no campo da ciência experimental, procuram fazer com que aqueles
que realizam pesquisa no campo da engenharia genética possam comprovar, de forma absoluta,
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que o que é avaliado como seguro, agora não causará nenhumdano no futuro .
Não obstante o esforço empreendido pelas defensoras da transgenia, os argumentos não
convencem. Em uma época em que se tornou rotineiro o questionamento “em quem e em que
acreditar”, e em que o compromisso das indústrias agroalimentares é, primeiramente, com o
lucro, os riscos alimentares ocasionados pelos OGMs, clamampor medidas de cautela.
Ademais disso, a aplicação do Princípio da Precaução “
não pode ser realizada de
maneira simplista, pois existe uma complexa relação entre progresso científico, inovação
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tecnológica e risco
”
.
Sobremais, a aplicação do Princípio da Precaução não significa que a indústria deva
apresentar provas absolutas e incontestáveis de que os transgênicos são perfeitamente seguros. A
exigência do referido princípio não chega a tais extremos, pois esta interpretação ensejaria uma
produção de prova impossível e prejudicaria irremediavelmente a pesquisa científica. O que a
indústria deve provar é que, diante das pesquisas e testes possíveis de serem efetivados, dentro de
.
12
AZEREDO, Raquel Monteiro Cordeiro de.
Op. cit.
p. 158.
13
Precauções & Preconceito.
Update,
Revista da Câmara americana de Comércio de São Paulo, out./2000, p. 20.
apud
SILVA, Jorge
Alberto Quadros Carvalho. Alimentos Transgênicos: Aspectos Ideológicos, Ambientais, Econômicos, Políticos e Jurídicos.
In:
Biodireito, Ciência da vida, os novos desafios. Organizado porMariaCelesteCordeiroLeiteSantos. SãoPaulo: RT, 2001, p. 342.
14
VIEIRA,AdrianaCarvalhoPinto.
Direitodos consumidores e produtos transgênicos
. Curitiba: Juruá, 2005, p. 124.
15
ANTUNES, Paulo de Bessa.
Op. cit.
p. 35.
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